Por Tamires Miranda Neto, Gerente de Pecuária da CFM
“Em 1999, a CFM realizou seu primeiro tour técnico aos Estados Unidos, que resultou na criação do inovador Megaleilão CFM, revolucionando o modelo brasileiro de comercialização de reprodutores. Vinte e seis anos depois, retornamos ao país para uma nova jornada de aprendizado.
No período de 1 a 17 de fevereiro de 2025, fizemos uma viagem enriquecedora, novamente aos Estados Unidos. Desta vez, nosso objetivo não estava apenas em observar possíveis adequações ao nosso modelo de negociação, mas também levantar o máximo possível de informações sobre produção em fazendas de cria, recria e engorda no país que é referência mundial em produtividade.
Os planos começaram há algum tempo, durante conversa despretensiosa com Ney Conti, amigo de longa data, quando comentei sobre a possível viagem e alguns criatórios e eventos que fariam parte dela. Foi aí que percebemos a similaridade com um roteiro já programado por ele para uma viagem com sua equipe. Falei para o Ney: “Vamos nos encontrar em mais de uma oportunidade nessa viagem. Poderíamos ir juntos. O que acha?”. Prontamente ele concordou e, assim, passamos 15 dias vivendo uma experiência incrível, conhecendo fazendas, leilões e trabalhos dos mais variados e com diversos desafios, além da cultura local e pessoas fascinantes.
Não concordamos com a aplicação de tudo o que vimos, devido às diferenças nas realidades climáticas, disponibilidade tecnológica e também aspectos culturais. Mas compartilho aqui algumas informações que considero relevantes. Uma das observações mais marcantes dessa viagem foi a forte valorização do touro efetivamente melhorador nos EUA. Essa alta demanda ocorre tanto pela atuação profissional do pecuarista americano, consciente da importância da genética para ampliar resultados, quanto pelo baixo percentual de fêmeas que passam pela inseminação artificial, provavelmente em decorrência da carência de mão de obra.
Nossa jornada em números
Durante os 15 dias de viagem, percorremos 7.355 quilômetros, passamos por 9 estados e fizemos 11 visitas técnicas, sendo 4 importantes criatórios, 3 centrais de reprodução, o leilão da Schaff Angus Valley, Texas A&M University, CUP Lab e American Angus Association.
Deleu’s Ranch – Collinsville, Texas
Nossa primeira parada foi no Deleu’s Ranch, propriedade de Carlos Deleu (brasileiro residente nos EUA há mais de 30 anos), sua esposa Laurie e o filho Kevin. A família trabalha com cerca de 40 vacas Angus em 50 hectares. Eles produzem feno como fonte de volumoso. Os demais alimentos para os animais são adquiridos de fornecedores. A principal atividade do rancho está ligada ao cavalo quarto-de-milha, bem como à preparação de animais, equinos e bovinos, para exportação ao Brasil.
Penz Angus Ranch/Albrecht Angus – Durant, Oklahoma
O próximo destino foi o Penz Angus Ranch/Albrecht Angus, no qual vistoriamos 200 touros que seriam vendidos no leilão do dia 17 de fevereiro. Os touros estavam, em média, com 18 meses, todos com exame andrológico, sendo 50% dos animais pertencentes a cada criatório (Penz e Albrecht).
American Angus Association – St. Joseph, Missouri
Seguimos para a American Angus Association. Fomos recebidos, com muito orgulho, por um grupo de brasileiros (Rafael, Pedro e Larissa) que integram o time de cinco pesquisadores responsáveis pelas avaliações da raça Angus. Eles nos apresentaram, em linhas gerais, os direcionamentos atuais para o melhoramento da raça e conversamos sobre as mais modernas ferramentas aplicadas no melhoramento genético de bovinos.
Schaff Angus Valley – St. Anthony, North Dakota
Em St. Anthony, participamos do leilão da Schaff Angus Valley, que comercializa 400 touros em um único remate. Evento muito valorizado, que fechou com média aproximada de US$ 17.000 por touro, o equivalente a 163 arrobas de boi gordo nos Estados Unidos, com pagamento à vista.
Os touros vão a leilão individualmente, mas ficam agrupados para vistoria prévia por paternidade, sendo esta uma das principais informações que guiam a decisão de compra. O que mais nos impressionou foi a agilidade do leilão – a rapidez é garantida pelo padrão de manejo: observamos que um touro era removido da pista para que outro fosse colocado, mesmo antes de serem finalizados os lances.
No estacionamento do evento, chamava atenção a quantidade de caminhonetes com trailers atrelados, prontos para transportar os touros comprados – reflexo do envolvimento dos proprietários, familiares e encarregados com a atividade. Também nos impressionou a simplicidade das instalações. Os compradores estavam todos presentes (não havia transmissão para TV ou Internet), sentados em arquibancadas e focados no negócio: comprar a genética que buscavam para melhorar o seu rebanho. Um negócio simples e funcional!
Connealy Angus – Whitman, Nebraska
Visitamos a Connealy Angus, fazenda com extensão de 22 mil hectares divididos entre pastagem de gramínea nativa e produção de feno e outros alimentos irrigados em pivôs. O rebanho conta com 3.500 matrizes. Anualmente são comercializados 1.200 touros. Além da pastagem nativa e do feno, utilizam alfafa, DDG e soja peletizada na alimentação dos animais.
Mais uma vez observamos o comprometimento dos proprietários com a atividade. A fazenda conta com 17 colaboradores, sendo 5 deles membros da família – que trabalham diretamente nas atividades. Conversamos bastante sobre algumas dificuldades de manejo, como as particularidades daquele ambiente onde, por exemplo, bebedouros sem sistema de aquecimento precisam ser vistoriados diariamente para quebra do gelo.
Western Sire Services – Gordon, Nebraska
Visitamos a Western Sire Services, central de reprodução com capacidade para 110 touros alojados em suas instalações, produzindo cerca de 1,2 milhão de doses por ano. Uma curiosidade é que os piquetes dos touros têm a forma de um extenso corredor: em uma extremidade está a água e na outra o alimento, estimulando a movimentação e exercício dos animais.
Nebraska Bull Service – McCook, Nebraska
A próxima central de reprodução que visitamos foi a Nebraska Bull Service, que trabalha forte com prestação de serviços para outras centrais e para o produtor final.
CUP Lab – Ames, Iowa
No estado de Iowa, visitamos a CUP Lab, empresa especializada na avaliação de carcaça através de ultrassonografia. Tivemos reunião superprodutiva, discutindo informações técnicas e de mercado. Nessa ocasião, nos foi relatada a baixa demanda do Brasil pelo trabalho mencionado, atribuída à falta de remuneração por qualidade de carcaça, algo que acontece de forma massiva e regular nos Estados Unidos.
Integrated Breeders – Hearne, Texas
De volta ao Texas, visitamos a Integrated Breeders, central de reprodução que aloja de 60 a 80 touros e produz em média 500 mil doses por ano, todas em palhetas médias. São prestadores de diversos serviços reprodutivos, tanto para touros quanto para fêmeas. Entre outros assuntos, falamos sobre a prestação de serviços direta ao produtor e nos chamou atenção a modalidade em que o criador leva seu touro até a central, faz uma coleta, congela o sêmen e sai levando o touro de volta à fazenda. Tudo no mesmo dia.
Texas A&M University
Visitamos também a Texas A&M University, na qual conhecemos, entre outras, as dependências frigoríficas da área de tecnologia de carnes. Essa unidade tinha capacidade de abate de 8 bois, 50 porcos e 50 ovelhas por dia, para fins de pesquisa. As carcaças podiam ser facilmente transportadas da sala de abate até as câmaras frigoríficas, passando pelas salas de aula.
J&J Ranch – Bay City, Texas
Finalizamos nossa viagem técnica no J&J Ranch. O rancho tem capacidade estática para 3.000 animais em confinamento, com 30.000 cabeças passando anualmente pelas instalações – um negócio de comercialização e recria muito intenso.
Impressões Finais
Nesses 15 dias de jornada, conhecemos pequenos e grandes criadores, eventos e instituições. Em comum entre eles, constatamos a aplicação massiva de tecnologia nas diversas etapas do trabalho, essencial tanto pela carência de mão de obra quanto pela busca constante de eficiência e rentabilidade.
Além de todo o aprendizado técnico adquirido, tivemos a oportunidade de criar e estreitar laços com profissionais comprometidos em produzir mais e melhor a cada dia, cujo exemplo nos fez voltar ao Brasil cheios de motivação e ideias para aprimorar nossas práticas por aqui”.